Que futuro para o jornalismo?
Editorial

Que futuro para o jornalismo?

Sete anos após o anterior, realizou-se o 5.º Congresso dos Jornalistas, de 18 a 21 de janeiro, no Cinema São Jorge, em Lisboa, e o Correio da Feira voltou a marcar presença, com toda a sua equipa de jornalistas.

Voltou-se a discutir o jornalismo e a primeira sensação que se teve foi a de déjà vu, mas com os problemas a multiplicarem-se por sete (ou mais…). Precariedade salarial, contratual e mental dos jornalistas; problemas de ética; regulação; administrações e poderes políticos, com interesses mais ou menos ocultos, com influência (ou tentativa) nas decisões editoriais; insustentabilidade dos modelos de negócio; etc., num cenário desolador acompanhado de uma assunção: o jornalismo, essencial para a democracia, é uma profissão seriamente ameaçada. Tudo isto, sete anos após o anterior ‘grito’ do jornalismo e dos jornalistas, que tinha como lema a ‘mudança’, e no ano em que Portugal assinala os 50 anos do 25 de Abril. Ironias…

Como seria de esperar, a questão da Global Media (despedimento coletivo) dominou muitas das atenções do Congresso. Sublinhando total solidariedade com os colegas da Global Media, é de extrema importância não cair na tentação de individualizar os problemas do jornalismo a um grande grupo. A crise do jornalismo é transversal a (praticamente?) todos os órgãos de comunicação social nacionais, agravada no jornalismo de proximidade, os regionais, onde o nosso centenário se move há 126 anos. Mérito aos organizadores do Congresso que dedicaram a manhã do dia 20 ao jornalismo local, com base num périplo em que se ouviram os profissionais que trabalham fora dos grandes centros urbanos, com relatos que demonstram que o jornalismo local, sério, responsável e rigoroso, está a morrer, sendo quase inexistente em vários pontos do país, com todos os perigos que isso acarreta. Só a imprensa livre local é que pode fazer o real escrutínio da atividade municipal, uma atividade que entra diariamente pelos nossos ecrãs (independentemente das cores partidárias), através de propaganda realizada por grandes máquinas de comunicação.

Novidade neste Congresso foi a discussão sobre os perigos (e eventuais vantagens) da Inteligência Artificial e até que ponto é mais uma ameaça ao jornalismo, com uma conclusão clara, os princípios de responsabilidade e de ética são as principais armas de diferenciação ao dispor dos jornalistas.

Das conclusões retiradas destaco três. Em primeiro lugar a aprovação por unanimidade da moção que propunha a marcação de uma greve geral de jornalistas. A última tinha acontecido em 1982 e o Sindicato dos Jornalistas irá definir a data da próxima paralisação. Uma medida que aplaudo. Se a sociedade deixou de perceber (é certo que também devemos assumir culpas próprias) a importância do jornalismo, só nos resta parar as canetas e os teclados.

Em segundo, a maior dúvida: Qual a melhor forma de sustentabilidade do jornalismo no futuro? É certo que o modelo de negócio anterior caducou, como se pode ler na resolução final do Congresso, “a sustentabilidade financeira do jornalismo exige medidas imediatas e soluções estruturais, sob pena de ser destruído um instrumento fundamental para a saúde da democracia, tão ameaçada em todo o mundo”. São precisos novos caminhos e dois se abrem: financiamento público, com todos os perigos que isso acarreta, ou das grandes plataformas tecnológicas (taxas), com as dificuldades que isso implicaria.

No primeiro caso, é preciso perceber de que forma entrariam esses apoios públicos e garantir que não chegam sob a forma de ‘influência’, ou seja, deve obedecer a critérios claros e rigorosos. No segundo, parece lógico que as grandes plataformas tecnológicas paguem pelos conteúdos que utilizam, provenientes da comunicação social, lucrando milhões com os mesmos. A dúvida centra-se no enquadramento legal para se taxar o conteúdo utilizado e poder para o fazer valer perante tão grandes plataformas tecnológicas.

Por último, sublinhar a importância da autorregulação, em defesa de um jornalismo de qualidade e ético, único caminho para o setor readquirir importância, credibilidade e defender a democracia. Como disse o jornalista Miguel Carvalho, citando Joseph Pulitzer, “A Imprensa e a República só́ têm uma de duas hipóteses: ou avançam juntas ou caem juntas”.

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Nélson Costa

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DIRETOR | Jornalista de formação e por paixão. Curioso, meticuloso, bom ouvinte, observador até das próprias opiniões.
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