Problema da habitação
Opinião

Problema da habitação

Li com muita atenção o artigo de António Cardoso, publicado no dia 27 de outubro, com o título ‘A chave de acesso mais fácil à ‘habitação’ pode estar nas mãos das câmaras municipais’ e, relativamente ao tema, gostaria de fazer algumas considerações:

O problema atual da falta de habitação é um facto, e tem-se vindo a agravar, gradualmente, dada a falta de medidas implementadas pelos governos atempadamente.

Ao longo dos anos, com valor de rendas baixo, não havia incentivo para os senhorios investirem ou aparecerem novos investidores. Podemos dizer que se entrou numa época do ‘rame-rame’. Esta situação foi colmatada pelo aparecimento de compradores de casa própria, tendo em atenção a baixa inflação e a taxa de juros praticada pelos bancos ser extremamente reduzida e a avaliação dos imóveis mias consentânea com a realidade, objeto de financiamento bancário.

Entrou-se numa situação estável em termos de mercado e os governos, não tiveram uma visão futura do que poderia acontecer, salvo algumas no campo dos impostos para arrecadar receitas.

Criou-se a figura do Alojamento Local, através do Decreto-Lei n.º39/2008, que foi objeto de várias alterações e com o Decreto-Lei n.º 128/2014 foi criado o regime jurídico da exploração dos estabelecimentos de Alojamento Local, que entretanto, procedeu-se a algumas alterações, na ótica da proteção dos consumidores através da Lei n.º 62/2018.

Das alterações mais significativas, para além de outras, destaco a criação da figura dos ‘quartos’ (anteriormente estavam nos estabelecimentos de hospedagem), desde que estejam localizados na residência e não excedam três unidades, a fiscalização compete à ASAE e Câmara Municipal e foram criadas as áreas de contenção.

Estas áreas de contenção nasceram com uma intenção única de preservar a realidade social dos bairros e lugares, por freguesia, para a instalação de novo Alojamento Local, sendo que a Câmara Municipal pode impor limites ao número de estabelecimentos de Alojamento Local nesse território, que podem ter em conta limites percentuais em proporção dos imóveis disponíveis para habitação.

Mas convém lembrar que os estabelecimentos de Alojamento Local são os que prestam serviços de alojamento local, mediante remuneração, a turistas, independentemente da sua nacionalidade, assim como outras pessoas, que por vários motivos se desloquem em períodos limitados.

Das estatísticas existentes, o exercício desta atividade tem-se centralizado principalmente em Lisboa, Porto e Algarve e de uma forma forma residual noutros Municípios dada a procura dos turistas para estas zonas.

Mesmo neste locais, tem perdido um pouco a sua força, devido às alterações significativas, entretanto aprovadas em prejuízo de quem quer investir nesta área.

Por outro lado, a procura por turistas, normalmente é centralizada para sítios onde existem estruturas de cativação, diurnas e noturnas, património cultural e outras atrações.

De referir, que está a nascer uma nova modalidade de alojamento (arrendamento de média duração), que poderá substituir alguns dos alojamentos locais, são os inquilinos-nómadas digitais que fazem circuitos mundiais, ficando, por exemplo, três meses numa cidade, depois vão para outra e depois para outro destino qualquer. É menos lucrativo para o proprietário, mas mais estável e com menos custos de manutenção e limpeza. Esta modalidade poderia ser explorada por municípios, onde esses inquilinos nómadas tivessem condições atrativas nas suas horas de lazer.

Segundo notícias do jornal Público, de 3 de novembro (artigo de Bárbara Baltarejo), no primeiro ano, desde a alteração à lei dos estrangeiros, o Governo português emitiu 2600 vistos (duração de um ano) para trabalhadores remotos, isto é, inquilinos nómadas.

Penso que esta figura de alojamento Local, já teve melhores dias de incremento do que agora, principalmente nos municípios menos procurados e que pouco têm feito junto das plataformas digitais, em termos de publicidade do que têm para oferecer.

Veio a inflação galopante, provocada por vários motivos, e o grito de Ipiranga entoou no céu e o problema da habitação agravou-se. Taxas de juro elevadas com repercussões nos empréstimos bancários, nomeadamente no crédito habitação, onde as taxas de uma forma geral estavam e estão indexadas à taxa Euribor, fazendo com que o valor da prestação subisse assustadoramente, nalguns casos incomportáveis para o devedor.

Como consequência, houve e há casos de venda do imóvel, outros, dentro das possibilidades, renegociação da dívida e alguns casos de entrega ao Banco financiador do próprio imóvel.

Segundo o jornal Público, do dia 01 de novembro, um empréstimo de 150.000 euros, a 30 anos, custa mais, em média, mais 4.000,00 euros em trÊs anos, devido ao agravamento da taxa indexada Euribor a 12 meses, acrescido de um spread de 1%.

Entretanto, o valor dos imóveis novos são mais elevados e as rendas elevadíssimas, para quem quiser arrendar, como exemplo os quartos para uma maioria dos estudantes, havendo estudantes mais carenciados, que não podem prosseguir os seus estudos dada a carestia no aluguer.

Situação dramática para o setor de habitação, esperando que as medidas propostas no orçamento do Estado para 2024 produzam algum efeito positivo para atenuar esta situação.

Penso que uma das medidas que o estado podia implementar, seria direcionada para a taxa de juro sobre o financiamento bancário a solicitar para quem quer comprar casa e quer investir na construção para habitação de arrendamento.

A prestação de capital mensal mantinha-se, mas a taxa de juro deveria ter uma bonificação suportada pelo estado durante um período adequado, em condições a definir, sendo a bonificação maior nos primeiros anos e depois com tendência para zero.

O financiado sabia o que iria pagar durante um período de tempo fixado, (capital sempre igual e uma parte dos juros) sem sobressaltos e o estado para compensar o montante de juros bonificados, poderia ir buscar essas verbas a outros sítios, como por exemplo, deixando de dar temporariamente subsídios a entidades cujo os benefícios para a sociedade não são de primeira necessidade.

O preço final da construção, assenta no valor do terreno, fiscalidade (20 a 30% no preço final da venda) custos dos materiais, e de mão de obra e nos custos financeiros.

De referir que a construção (materiais e serviços) para habitação é tributada á taxa máxima de IVA em vigor, o que não se compreende.

Segundo Jorge Reis, diretor geral da Associação Portuguesas das Empresas de Betão Pronto (APEB)” para se mitigar o aumento dos custos da construção poderão existir medidas como a redução do IVA à construção ou do IMT/IMI”. E para fomentar a construção, os municípios poderão ter um papel fundamental, podendo disponibilizar terrenos para construção de qualidade a preços controlados. Também defende que as autarquias e organismos públicos” deverão ser mais rápidos e ágeis na atribuição das licenças para construção, pois os prazos que se verificam hoje são demasiados extensos e indiretamente contribuem para aumentar o custo da construção para habitação.

No orçamento de Estado para 2024, em discussão, está prevista uma verba para a habitação e oxalá que seja bem aplicada e vá ao encontro do que se pretende em tempo útil, devendo haver uma apertada fiscalização na sua aplicação e finalidade.

Estou confiante que algo vai melhorar, mas até lá, muita água correrá por rio abaixo.

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Manuel Bastos

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COLUNISTA
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