Os cidadãos sentem-se afastados da política. Que fazer para recuperar a confiança dos eleitores?
Opinião

Os cidadãos sentem-se afastados da política. Que fazer para recuperar a confiança dos eleitores?

As primeiras eleições legislativas realizadas em Portugal em democracia foram responsáveis pela formação da Assembleia Constituinte. A taxa de abstenção registada foi apenas 8,5%, valor nunca mais atingido em todos os actos eleitorais seguintes.

Os níveis de participação em território nacional, têm caído ano após ano, tendo registado nas legislativas de 1985 uma taxa de abstenção de 27,5%, tendo subido para 33,8% em 1995. Nas legislativas de 2019, a abstenção atingiu o máximo histórico de 51,4%, ou seja, mais de metade do país não votou!

Esta subida vertiginosa da abstenção, deve-se à ausência de medidas que invertessem esta tendência, que contribui para governos com duvidosa “representação dos cidadãos”!

Segundo estudos realizados, são os jovens quem menos vota, a par dos cidadãos com mais baixos rendimentos, com menor instrução e aqueles que vivem no interior do país, cujo afastamento eleitoral prende-se com a ‘falta de representação na política’, de várias camadas da população, particularmente as mulheres, apesar das com cotas obrigatórias de representatividade nas listas de candidatos a cargos de eleição. A ausência deste critério ao não abranger os jovens e as minorias étnicas que reconhecidamente não são devidamente representados. Aliás, a composição da Assembleia da República na última legislatura, em 230 deputados, apenas 86 eram do sexo feminino, onde apenas 20 eleitos tinham menos de 35 anos. É preciso voltar a criar um diálogo com as pessoas mais afastadas do voto, mas para que a reconquista da confiança dos eleitores tenha resultados, é preciso ‘haver um compromisso político’ assente ’em práticas objetivas’.

Por outro lado, hoje há mais participação política dos cidadãos, por via de protestos, boicotes ou assinatura de petições, o que leva as pessoas à política expressando reivindicações fora das eleições. Esta nova realidade cujas práticas e processos que têm vindo a estimular o regresso à vida pública, manifestam-se em iniciativas como os orçamentos participativos ou as assembleias de cidadãos nas autarquias. O problema da abstenção está diagnosticado, recomendando diversas respostas, que devem incluir, por exemplo, o aumento da conveniência da participação eleitoral. Atualmente, já é possível votar antecipadamente e existe ainda o voto em mobilidade. Mas a agilidade eleitoral tem que ir mais longe sendo importante alargar não só estes métodos, como criar outros complementares como localizar assembleias de voto em complexos desportivos, nos centros comerciais, locais de passagem etc.

Outra questão pertinente, prende-se com o “desperdício de votos” que se verifica em vários círculos eleitorais, como Bragança ou Portalegre, onde a população só consegue eleger dois ou três deputados que são, normalmente, “dominados por PS e PSD”. Significa isto que quem vota em qualquer um dos outros partidos não terá representação no Parlamento. Uma solução objetiva a seguir seria manter o atual sistema eleitoral e complementá-lo com um círculo de eleição nacional. Por outras palavras, um eleitor teria dois votos, um para votar no seu candidato a nível do distrito, como hoje acontece, e em simultâneo teria a possibilidade de votar para um “círculo nacional” onde todos os eleitores votariam. Esta medida de reforma do sistema eleitoral, “é antiga” cuja vontade política em alterar “as regras do jogo” não tem existido, porque as consequências prejudicariam a dimensão dos dois maiores partidos, PS e PSD… Mas se queremos que a relação entre as instituições democráticas e os cidadãos seja o garante da representação dos cidadãos é preciso corrigir este “desperdício de votos”. Aliás, as práticas políticas internas seguidas na generalidade pelos grandes partidos são um mau exemplo do respeito democrático pois visam segurar o poder a todo o custo. Em recente eleição interna de um grande partido, constatou-se que existência de estruturas com mais de 300 militantes, cujas cotas pagas activas o número reduziu 189 votantes. Estranhamente muitos militantes não sabiam que as suas cotas estavam pagas o que levou a que nas urnas o número de votos depositados baixaram para os 130. Noutra estrutura do partido que tem cerca de 40 militantes, como ninguém pagou as suas cotas, só votaram 8, porque eram os únicos com cotas em dia! Chegados aqui, que credibilidade nos dão estes aparelhos partidários que escolhem os candidatos a futuros pimeiros- ministros? Isto acontece tanto no PS como no PSD, cujos exemplos, são a negação desse sistema partidário, a quem a Constituição dá o “Poder de escolher o Governo e os seus Deputadosda Nação”. Aliás, nenhum cidadão independente, consegue ser governante ou servir a o Governo da Nação, sem passar pelo filtro selecionador dos partidos…

Concluindo, é preciso “reformar o sistema vigente dos partidos na vida pública”, cujos métodos deviam preconizar “práticas que fossem representativas dos cidadãos”. Caso o não façam, vão perigosamente agravar o afastamento dos cidadãos da política.  

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António Cardoso

Antonio Cardoso
COLUNISTA
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